Como tudo começou

Olá! Vou te contar toda a loucura que aconteceu comigo nos últimos 12 meses, mas antes, quero te dizer o seguinte: CALMA! Talvez você não esteja com HIV. Talvez você só tenha ficado maluco como eu! ...só isso! Inclusive, a gente não está sozinho nessa - eu conto nesse post aqui qual é o perfil das pessoas que leem este blog - então dá para imaginar como este é um problema recorrente, né? Também tem uma pesquisa anônima nesse post que no final dá pra ver os resultados. Isso é bem legal porque te dá uma ideia bem profunda sobre as pessoas que acessam (eu queria tanto ter encontrado gente na mesma situação para conversar na época... fiz até terapia por conta disso tudo - e tenho alguém especialista para te indicar, se preciso!) 

Se você quiser saber quem sou eu, para que você entenda melhor o perfil de alguém que viveu esta história, então eu indico que você clique aqui antes. Se isso não lhe importa agora, pode seguir com a sua leitura, então! ...se você tiver uma história parecida com a minha, me escreve contando para que eu possa publicá-la aqui também? Isso ajuda MUITO as pessoas que estão atravessando esse mar de incertezas (eu falo um pouco sobre isso aqui neste post). Eu também criei um chat anônimo para que você possa se conectar com outras pessoas que estão passando pela a mesma situação. Neste post eu explico passo a passo para você entrar nele, também!

😉 

Sabe outra coisa que eu preciso te dizer muito francamente, cara (ou mina, sei lá!)?! É que eu tive vários sintomas desses que se lê na internet (aqui tem um levantamento que estou fazendo das pessoas que acessam o blog). Sério mesmo! Tipo, dos 17 sintomas mais comuns de quem acabou de contrair HIV, eu tive cerca de 10 ou 11. 

Mano... é muito coisa, né? 

E para você não se perder na sua leitura, eu resolvi separar esse texto que você está lendo - que, apesar de grande, eu JURO que se você estiver na dúvida ele vai te ajudar, brother! Eu separei ele em algumas partes, para ficar mais fácil de ler. É tipo um livro com alguns capítulos, entendeu? Inclusive, eu sei que a sua paz só vai vir depois que você tiver a certeza que não foi contaminado (a), mas olha, isso aqui pode ser um baita refúgio para você.

É, isso mesmo!

Eu sei o quanto eu tive que sofrer em silêncio durante um tempão, pois não queria me expor e sei também o quanto esse meu comportamento só dificultou as coisas. Foi foda! 
Olha, para você ter ideia, vou te contar bem rapidamente as consequências do que rolou para você sacar a que ponto cheguei: 

• Eu tomei a PEP completa - se você não sabe o que é PEP, clique aqui;

• Eu comecei a ir mal no trampo;

• Dormia às 3h/4h da manhã;

• Comecei a ficar em casa sem motivo algum e sempre falava que tava sem grana para fugir das pessoas;

• Decidi, por conta própria, ir no CTA (Centro de Tratamento de Aids) quase que 1 vez a cada 15 dias para ver se eu seria diagnosticado naquele momento;

• Tive uma dor de garganta que durou 3 meses, e por isso passei em mais de 5 otorrinos durante este período;

• Um dos otorrinos me encaminhou para fazer terapia - e descobri o tal do estado de hipervigilância (talvez seja o seu caso, também);

• Eu tive diarreias;

• Eu perdi 5kg - eu tinha 69kg, fui para 64kg;

• Eu fiz mais de 10 exames de HIV - sabia até o nome das enfermeiras;

• Eu desenvolvi pan gastrite por conta dos remédios que tomei;

• Eu também desenvolvi esofagite erosiva (Los Angeles grau C - vai até o grau D) pelo mesmo motivo;

• Eu tive manchas avermelhadas na pele durante o tratamento com a PEP;

• Até hoje (12 meses depois do contato) eu tenho essas três coisas que te falei antes;

Então agora eu vou te contar como tudo aconteceu!

I. Como tudo aconteceu!

Como eu já disse, eu tenho 27 anos (hoje, dezembro de 2017, quase 28 anos) e estava com alguns amigos meus no aniversário de um outro brother. A gente acabou bebendo bastante e decidimos que "comer uma puta" ia ser do caralho! AHHHH, se eu soubesse que aquilo ia me custar bem mais do que os R$ 250,00 que eu paguei, eu jamais teria ido. Mas como eu fui e o fato já foi consumado, só me resta usar isso de aprendizado e ajudar a outra galera que vem atrás a ficar um pouco mais calma com a situação.

Uma nota: se você é menina/mulher, quero te frustrar dizendo que 95% dos homens que você conhece já foram no puteiro e isso é a coisa mais comum entre os homens. Aliás, quando eles estão juntos depois de um rolê, provavelmente estão contabilizando as moedas no bolso para saber se conseguem ir naquele puteirinho mequetrefe dar uma transada para fechar a noite com chave de ouro. 

Retomando depois da nota: então, eu fui no puteiro. Bati um papo de 30 segundos com uma mulher "x" e como eu já estava mais excitado que um cachorro não castrado, resolvi que seria um belo de um negócio subir com ela por aqueles "míseros" R$ 250,00. 

Eu sinto muito, galera, mas eu preciso dar alguns detalhes para que vocês entendam a parada inteira, beleza? 

Mas então... nós subimos! "Subimos" significa que fomos para o quarto, já que o puteiro tinha dois andares. Não nos beijamos nem nada, porque eu sou nojentinho para caralho para beijar uma mulher que tinha acabado de chupar uns 2 pintos (2? Vamos fechar em 3, vai...) antes de mim. Mas eu confesso que para mim é mais fácil andar em uma corda bamba entre dois prédios de 100 andares, do que transar de camisinha. EU NÃO SEI TE EXPLICAR, PARCEIRO (A), MAS EU NÃO CONSIGO TRANSAR COM CAMISINHA ...e é aí que a merda toda acontece, porque, enquanto ela me fazia um oral sem camisinha (e eu imaginando que escolhi a mina certa, porque as putas, geralmente, não topam fazer nada sem camisinha - anote este ponto, ele é importante) ela olhou para mim e, como em um passe de mágica, se posicionou de um jeito que foi só empurrar meu pinto para dentro dela - SEM CAMISINHA. Ela deve ter pulado umas 10 vezes e aí eu me liguei na merda que estava fazendo e pedi para ela parar e sair de cima ...e assim ela fez - contrariada, mas fez.

Ela acabou voltando para o oral e, enquanto isso, eu já estava levemente afetado pela merda que eu tinha acabado de fazer. Sabe quando você come um pudim enquanto estava de dieta? Então, esse peso na consciência que aparece 5 segundos depois da primeira colherada foi o que aconteceu comigo também. Eu já não conseguia mais relaxar enquanto estávamos lá. Bati uma punheta sem vergonha e acabei gozando rápido só para ir embora para casa e traçar um plano para "limpar" a merda que eu tinha acabado de fazer. Fui embora sem avisar nenhum amigo meu. Eu simplesmente paguei o que tinha que pagar, saí e peguei o primeiro táxi que vi para voltar para casa. 

II. Chegando em casa...

...eu corri pro chuveiro. Limpei meu pinto com uma água mais quente do que água para fazer miojo. Eu pensei que isso ajudaria a matar qualquer impureza, mas antes de você me julgar, lembre-se que eu estava bêbado e tinha acabado de comer um pudim na dieta - acho que isso é minimamente justificável para você sacar que eu realmente acreditei que aquilo me ajudaria. 

Eu sei que eu não falei antes, mas o dia da transa foi de sábado para domingo, então fiquei bitoladasso durante todo o domingo, procurando a cura para o meu problema. Foi então que descobri a tal da PEP e, como eu tinha até 72h para começar a tomar, esperei até segunmda-feira, às 15h, para ir lá no CTA da Penha. E fui... 

Outra nota: assim que puder, vá atrás da PEP o quanto antes. Não faça como eu, tá? Eu fui burro e preguiçoso, mesmo. Aliás, se você mora em São Paulo capital, dá para você ir no Emílio Ribas, que é 24h e te dão os remédios super rápido. 

Voltando da nota: Chegando lá no CTA, eles coletaram o meu sangue e constataram que eu não tinha HIV e me autorizaram a tomar a PEP. Peguei os remédios, tomei lá mesmo a primeira dose e escondi os frascos a sete chaves dentro da minha mala com o meu computador do trampo. Esses remédios permaneceram durante os 30 dias na mala - ainda bem que a minha mãe não mexeu lá! 

No meu caso, eu tive que tomar 5 comprimidos (parece que são 3, tá galera? Mas é que um tinha acabado aí eles davam alguns a mais que complementavam a dose final). O foda é que os remédios são muito fortes. Além de te deixarem amarelo (icterícia), ele machuca demais o seu estômago e te deixa muito enjoado. Eu tive que viver assim durante os 28 dias da dose. 

A médica que me atendeu foi muito legal comigo. Me tranquilizou e me deu muita margem de tempo para podermos conversar e eu pude esclarecer as principais dúvidas que eu tinha. Coisas como "posso beber cachaça enquanto tomo o remédio?" e "o que vai acontecer comigo enquanto eu estiver tomando isso?" foram perguntas que ela dedicou um baita de um tempo para me ajudar a entender como seria. Como meu aniversário seria no 20° dia enquanto eu tomava o remédio e a médica disse que eu poderia ingerir bebida alcoólica, eu acabei bebendo MUITA cachaça. MUITA MESMO! Tomei tequila, cerveja, busca-vida (pinga com mel) e vodka enquanto sambava e babava ao som da bandinha que estava no quintal do espeto. Eu só te falei isso porque, mais para frente eu comecei a me arrepender muito em ter bebido enquanto tomava o remédio. Eu achei que eu tinha anulado o efeito da medicação e por isso estava do jeito que estava. ...mas nada a ver! Eu que viajei mesmo! 

Olha isso que louco: enquanto eu tomava o remédio, umas manchas vermelhas e de alta intensidade começaram a aparecer no meu corpo. Mais precisamente no meu peito, costas, pescoço e testa e, na hora que eu percebi, eu pensei "tranquilo, a médica disse que isso ia acontecer mesmo". Eu também acreditava que depois que acabasse de tomar os remédios, em uma ou duas semanas (no máximo), as manchas sumiriam e eu estaria de volta. Mas isso não aconteceu. Elas ficaram em mim - para falar a verdade, elas estão em mim até hoje (1 ano depois), mas isso não tem nada a ver com HIV.

III. A merda começa aqui!

O problema real foi que, depois de 4 semanas do final do remédio as manchas ainda não tinham sumido. Pelo contrário: brotavam mais e mais e eu já estava começando a ficar louco. Foi então que eu tive a brilhante ideia (jênio - com "j" mesmo!) de jogar no google "manchas na pele hiv" e a primeira imagem que eu vi foi essa aqui: 

Essas manchas, caros amigos desconhecidos virtuais, eram EXATAMENTE IGUAIS as que eu tinha! Eu não sei se você entendeu BEM a merda que eu tinha acabado de descobrir, por isso, vou te dizer da onde eu tirei essa foto: do site do Ministério da Saúde.

Que bosta, não? Essas lindas manchinhas que me fizeram parecer um adolescente na puberdade são conhecidas como "rash cutâneas" e são comuns em portadores de HIV e, para minha infelicidade, elas eram ABSOLUTAMENTE idênticas as minhas. Inclusive nos mesmo lugares: peito, ombro, costas, pescoço, testa e até na cabeça. 

Nessa hora, parceiro (a), eu empurrei a mesa e a cadeira em que eu estava sentado tinha algumas rodinhas. Ela deslizou para trás como se não houvesse amanhã! Em seguida, me levantei e comecei a andar pela casa de um lado para o outro com a mão na testa e dizendo "MEU DEUS DO CÉU!" - esta era a minha expressão que, no fundo, traduzia que eu tinha a certeza de que estava infectado pelo vírus. Por sorte, meus pais não estavam em casa e não viram o meu desespero aparente enquanto eu estava convicto que eu tinha HIV. 

Sabe o que eu fiz depois disso? Me troquei e fui correndo para o Emílio Ribas. Fui lá pedir para fazerem um exame de HIV em mim ...e foi aí que eu descobri que eles não fazem exames assim de HIV assim, acredita? Eles só fazem em situações parecidas com aquela em que fui no CTA da Penha pedir para tomar a PEP, lembra? Como eu aprendi durante toda a minha vida a falar a verdade, eu contei logo de cara que eu tinha passado tudo aquilo nos últimos 30 dias e que precisava de qualquer jeito fazer um exame para saber se eu estava ou não com HIV.

Para piorar tudo, o dia em que eu me deparei com a foto que mostrei para vocês foi no sábado de carnaval, no período da manhã e não tinha NADA ABERTO. NADA. Nem o CTA da Penha que eu comecei o tratamento e nem nada que eu pudesse conhecer e que poderia me ajudar. A enfermeira me contou que eu poderia ir lá no Grajaú (é mais perto eu ir para a praia do que para o Grajaú, para você ter uma ideia) que podia ser que eles topariam fazer. Mas não ia rolar eu me deslocar até lá sem ter a certeza de que conseguiria fazer o teste. 

Conclusão: eu continuei com a dúvida, estraguei o meu carnaval, porque estava certo de que tinha HIV e tive que esperar até o período da tarde da quarta-feira de cinzas para voltar no CTA da Penha e fazer um novo exame. 

IV. No CTA da Penha

Quando entrei no CTA, eu fui para uma salinha chamada "acolhimento" e lá eu desabafei demais. Tirei a camiseta, mostrei para a enfermeira que me respondeu com um motivante "nunca vi isso quando toma o coquetel".

Ah! Era tudo o que eu queria ouvir, mesmo! - e claro que eu estou sendo irônico, caro leitor!

Como a minha mente estava convencida de que eu tinha HIV, eu comecei a entender que, se a maioria das pessoas que tomam o coquetel não contraem o vírus quando são expostos à ele, logo, eu que tomei e tive as manchas, sou um tremendo exemplo de ineficácia do remédio e, por isso, desenvolvi este sintoma. 

Tudo a ver né? ...é, eu sei que não, mas na época isso fazia sentido e me empurrou ainda mais para baixo!

A verdade é que a minha mente estava frenética em me provar que eu tinha HIV. Desenvolvi dores de cabeça intermináveis, que surgiam atrás do olho esquerdo e se ligavam com dores nos ombros e articulações. Eu não sei como isso aconteceu, mas eu sei que eu comecei a ficar indisposto, com muito sono, e tinha dor de garganta todos os dias (depois eu te explico como isso aconteceu - eu tive a resposta sobre a dor de garganta). 

Cara! Que loucura! Eu já estava com três sintomas relevantes para constatar que estava com HIV (estou falando de "constatar" segundo a ótica de um leigo, hein?! Não vá confundir isso com um diagnóstico preciso da doença e adotar o que eu estou falando como um fato para validar a sua loucura - assim como a minha - tá bom?)

Como se não bastasse, com o tempo eu comecei a sentir dores na axila e resolvi ir pesquisar. Pesquisei assim: "dores na axila HIV" e, advinha? Pois é! Era mais um sintominha dessa doença MAROTA BAGARAI que tem 50 mil sintomas intermináveis na fase aguda! 

Pronto! A loucura estava cada vez mais sendo retroalimentada pelas minhas pesquisas tendenciosas e me ajudando a fortalecer a crença de que eu tinha HIV. Não adiantava você me falar nada que fosse o contrário dessa certeza que eu tinha comigo! Simplesmente não adiantava! Eu estava convicto! Pleno e convicto que estava com esse bicho instalado em mim. 

Sobre as dores na axila, eu descobri que os gânglios linfáticos de diversas partes do corpo começam a inchar e causar desconforto e, um desses lugares é justamente embaixo do braço. Quando li sobre isso, acabei descobrindo que na virilha também acontece e para a vossa surpresa, caso leitor: também tive dores e sensação de inchaço nessa parte do corpo. 

Não sei se rio, ou se choro! Mas é muito louco escrever isso de novo e ter a sensação de que eu era um maluco, mesmo. Cara... eu viajei demais... 

Em uma linha do tempo, considere que essas descobertas e pseudo-sintomas aconteceram com, mais ou menos, 50 ~ 60 dias após o meu contato. Até aí, eu tinha um exame que dizia que eu não tinha sido infectado, mas ainda estava na "zona de risco", já que o período máximo é de 90 dias após o contato. 

V. 60 dias após o contato

Nessa altura, eu já não conseguia mas disfarçar. Conversei com um amigo meu do trabalho sobre o que eu estava vivendo e pedi para ele ir junto comigo em um posto de saúde, ali na Moóca, para fazer o teste. Como ele é muito parceiro meu, ele topou na hora! 

Chegando lá, fizemos o teste, que deu negativo, e eu até consegui voltar a sorrir aliviado por mais alguns dias, até que eu desenvolvi uma nova dor de garganta com pus e resolvi marcar um infectologista que não fosse os de posto de saúde - por um motivo simples: os médicos de hospitais públicos não tem muito tempo para conversar com pessoas angustiadas como eu estava na época. Eles simplesmente te perguntam qual foi o resultado do teste e, se você responder que foi negativo, ele vai dizer categoricamente que "o caso está encerrado, então".

Ok! Supondo que a vida fosse pragmática desse jeito, o meu problema estaria resolvido, mesmo. Mas ela não é. Eu já estava com manchas avermelhadas pelo corpo, dores de cabeça, indisposição, dores nas juntas, dores e inchaço nas axilas e virilhas e agora estava com uma dor de garganta com pus. Como você já pôde me conhecer um pouquinho, eu peguei o meu notebook e joguei no google "dor de garganta hiv" e óbvio que apareceu mais um sintoma.

O plano que eu decidi adotar naquele momento foi o de marcar um infecto particular. Foda-se! Tava cansado, já! O primeiro lugar que eu fui foi no Dr. Consulta - aliás, recomendo muito! Foi super rápido e barato para marcar uma consulta com um infecto e eu pude esclarecer algumas dúvidas que tinha naquele momento. Era uma sexta-feira e eu consegui marcar o médico para terça. Desmarquei meu compromisso no trampo e fui correndo para lá. A médica pediu o exame de sorologia novamente e tentou me tranquilizar - e eu até sai bastante animado de lá. 

Fiz o exame que deu negativo, novamente, mas nesse meio tempo decidi marcar um outro infectologista mais foda ainda! rs... Ah, cara! Dá um desconto, vai! Eu comecei a acordar no meio da noite com soadores intensos. Coisa de acordar ensopado mesmo! Claro que era algum ataque de ansiedade, ou coisa do tipo, mas a bosta é que eu pesquisei de novo no google e lá estava: "soadores noturnos pode ser um sinal de que você está na fase aguda do HIV". Louco né? Fica aqui um aprendizado: qualquer coisa que você jogar no google como "[escreva aqui o seu sintoma] + HIV", vai aparecer algo que valide a sua tese. Portanto, caro leitor, NÃO FAÇA ESTA MERDA!

VI. 70 dias

Eu tinha uma planilha excel que contava quanto tempo eu já estava de distância do dia do contágio. Isso me ajudava muito a saber em que pé que estava a loucura toda. Claro que o mais aguardado era o 90° dia, mas ele nunca chegava. 

Com 70 dias, eu passei em uma outra consulta com outro infectologista. Dessa vez eu fui com um cara chamado Dr. Vicente Amato Neto. Eu não sei quantos anos ele tinha, mas para mim parecia que ele tinha 157 anos. Apesar do cara ser uma das principais referências em infectologia no Brasil, a consulta com ele foi bem confusa. Primeiro porque ele não entendia o que eu falava (ele estava ficando surdo, por conta da idade), segundo que eu tinha que ficar gritando para que ele pudesse me ouvir, enquanto que outros pacientes estavam na sala de espera aguardando para ser chamado. Terceiro porque ele não enxergava direito e nem conseguiu ver direito as manchinhas que eu tinha no tórax e em outras partes do corpo. 

A parte boa foi que ele pediu um exame de contagem do vírus que, segundo ele, se neste não desse nada, então eu estaria completamente livre. Eu acreditei até jogar no google (google, viado do caraio!) Descobri que o exame de contagem das cópias do vírus não é o mais indicado, especialmente se você fez o tratamento da PEP.

Faz total sentido isso. Pense que a contagem só captura acima de 50 cópias por alguma unidade que não lembro (mas isso pouco importa para a gente aqui, tá? Lembre-se que o meu papel não é te educar sobre o HIV, mas te contar a neurose que eu passei para te ajudar a não se foder como eu). Se você tomou a PEP, ele vai eliminar a quantidade de vírus que estiver na sua corrente sanguínea, mas não necessariamente os vírus que estiverem incubados nas células C4 - portanto, parsa, esquece esse exame. Fica no de sorologia que ele resolve, mesmo!

Bom, fiz os exames que o médico pediu, e deu "indetectável". Conclusão: estava livre, até descobrir essa parada que te contei agora no google. Portanto, "volte duas casas!" - você ainda não está livre! 

Nesse meio tempo, tive que voltar em um otorrino (e essa devia ser o 4° Otorrino que eu estava indo, de tanta dor de garganta que estava tendo). Contei meu caso para este Otorrino que me recomendou que eu fosse atendido pelo Dr. Carlos Alberto - e esse foi excepcional! 

VII. Próximo dos 90 dias, mas não do fim da história...

Liguei para agendar com o Dr. Carlos e ele me recebeu em menos de 24h, devido a urgência que eu havia mencionado ao telefone. Ele foi muito gentil e a nossa consulta durou quase que 40 minutos. A propósito, eu não fui sozinho nessa consulta, eu levei o meu pai junto comigo.

Meus pais acabaram indo atrás de mim em um hospital aqui perto de casa, para saber como eu estava. Eu ia tanto no hospital e sempre pelo mesmo motivo (dor de garganta), que eles ficaram preocupados e foram atrás de mim em um dia em que eu já tinha coletado sangue para o exame de HIV e só faltava passar com o médico para ele dar o resultado. Como eu estava no intervalo entre fazer o exame e receber o resultado quando os meus pais chegaram, eu resolvi chamá-los para a cafeteria que fica do lado de fora do hospital e explicar o que tinha acontecido. 

Eu não tinha dado detalhes, mas foi o suficiente para eles sacarem a merda que tinha dado e me apoiarem. Nossa, até os meus pais entraram nessa! Você tem noção? Pouco tempo depois eu tive que contar TODA a histórias para eles, sem censura, para que entendessem e me ajudassem nessa! Contei tudo! Tudo mesmo! Contei que fui no puteiro, sem camisinha, que tomei a PEP e que tinha ido em vários médicos até ali. 

A loucura foi tanta, que me tornei muito mais reliigioso naquela época e ia até com o meu pai no "terço dos homens". Lá eu chorava e desabafava, sem que ninguém entendesse nada - apenas eu e meu pai. 

Voltando ao Dr. Carlos, ele fez a consulta de forma muito atenciosa e exemplar! Ele me examinou dos pés à cabeça e constatou que a maior parte das coisas que eu falava eram, de fato, psicológicas. Me deu mais um pedido para fazer outro exame e assim eu fiz. Levei de volta à ele que, ao final da nossa consulta, disse "vamos repetir o teste com 180 dias após o contato, para encerrarmos o caso". 

"PUTZ! 180 dias, Dr. Carlos? Como assim? ...e o papo de 90 dias?" - perguntei de forma intensa. "É que, para seguirmos o protocolo, precisamos ir até os 180 dias. Mas, olha, por mim, seu caso está encerrado... é só uma questão de protocolo, mesmo!" - ele disse, tentando justificar sua última fala. 

Fui para casa triste. Tinha tudo para estar feliz, mas só de imaginar que teria que esperar o dobro do tempo que já tinha esperado para saber como estavam as coisas, eu fiquei triste, inquieto e ansioso.

VIII. 120 dias

Já não aguentava mais! Sério! Era terrível. Não tinha como esperar mais 60 dias para pedir um novo exame e ver como estavam as coisas. Eu simplesmente peguei o Whats App do Dr. Carlos, mandei as fotos da minha axila inchada, e ele pediu para eu ir no mesmo dia lá no consultório dele para falarmos. 

Dessa vez ele me atendeu em um outro tom: um pouco mais impaciente. Essa era a terceira vez que eu estava indo lá e enchendo o saco dele para tentar provar que o meu caso era sério o suficiente. Me incomodava muito o fato de não ser levado à sério pelas pessoas. Embora hoje eu saiba que eu estava mesmo parecendo um louco, ser tratado como tal pelas pessoas é terrível! 

Retomando a consulta, ele contou sobre casos que ele já teve que lidar e até alguns mais antigos de quando a medicina nem era tão desenvolvida como é hoje e, ao final da consulta me disse: "lembra sobre os 180 dias que eu havia te dito? Então, pode esquecer! Este assunto já está encerrado, tá? Vamos seguir daqui para frente e usar esta experiência como uma oportunidade para não fazer de novo, combinado?"

"Combinado!"

Fui embora mais contente, mas ainda não estava 100% convencido. 

IX. 180 dias

Fiz mais um exame e, como já era esperado: negativo! Uffa! Estava aliviado, certo? Certo! Estava mesmo! 

Ao longo desse tempo de loucura minha, eu fiz terapia que me ajudou muito. Em uma das consultas, por exemplo, disse para a psicóloga que estava farto de achar que estava com HIV, mas não estava. Eu disse que estava cansado de não ser levado à sério pelas pessoas e que, por isso, decidi por conta própria, que admitiria para mim mesmo que estava com HIV, mas que isso não era o fim da minha vida. 

Podia sim ser o fim de alguns planos e sonhos que eu tinha, mas que certamente eu conseguiria contornar e passar por cima. QUE LOUCURA, né? Eu também acho! Mas sabe de uma coisa? Essa crença minha de que eu tinha HIV e de que isso não era o fim da minha vida, me ajudou muito a me sentir tranquilo. Era como se eu tivesse tido controle sobre aquilo que me atormentava. Era como se eu olhasse no fundo dos olhos do meu maior medo e dissesse: "eu te aceito e te domino!". Poético - e muito eficiente! 

Com 180 dias, não havia mais porque eu continuar pensando nisso - já estava se tornando ilógico me manter pensativo sobre isso. Foi então que eu comecei a me livrar desse medo e a respirar novamente o ar da liberdade e da tranquilidade de alguém que não era portador do vírus.

Apesar de já não conviver mais com esse medo, eu ainda estava com a dor de garganta (lembra que eu falei que ela me perseguiu por 3 longos meses?) Eu decidi ir atrás para entender o que era e também decidi ir atrás das manchas na pele. 

O que descobri foi:

• A dor de garganta era consequência de um refluxo laringoesofágico, proveniente da quantidade de remédios que tomei ao longo desse período. Eu não só tomei os antiretrovirais, como tomei vários antibióticos para combater a minha suposta "dor de garganta", que na verdade era só o resultado do ácido do estômago batendo nas minhas amídalas enquanto eu estava deitado para dormir. 

• As manchas na pele era foliculites. Enquanto eu tomava os antiretrovirais, meu sistema imunológico ficou 100% "focado" em matar o vírus e deixou que "infecções oportunistas" me atacassem. Basicamente, é como se eu, você e todo mundo possuíssemos um ecossistema de bactérias, fungos, germes, vírus e duendes do mal no nosso corpo, que estão controlados, até que você tenha uma queda na imunidade e eles entram em ação. Como fiquei extremamente estressado e o meu psicológico afetou demais, posso ter tido uma queda na imunidade, além de ter deixado o meu sistema imunológico "procurando" pelo vírus do HIV durante 30 dias. Aí, as bactérias/fungos atacaram os meus folículos (são os buraquinhos onde nascem os pelos do corpo) e causaram esta irritação. Eu até passei um remédio depois, mas não adiantou muito. Inclusive, preciso voltar na dermatologista para resolver isso, ainda!